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Por que só agora?

Por Guilherme Boulos

O ministro Teori Zavascki determinou hoje o afastamento de Eduardo Cunha do cargo de deputado federal e consequentemente da presidência da Câmara. Os motivos o Brasil inteiro já conhece.

A questão não é por que Cunha foi afastado, mas por que só agora. O pedido do Procurador Geral da República foi encaminhado ao Supremo no dia 16 de dezembro de 2015, há mais de quatro meses.

Ali estavam razões suficientes para o afastamento, as mesmas aliás utilizadas hoje por Teori para acatar o pedido de Janot: “A permanência do requerido, o deputado federal Eduardo Cunha, no livre exercício de seu mandato parlamentar e à frente da função de Presidente da Câmara dos Deputados, além de representar risco para as investigações penais sediadas neste Supremo Tribunal Federal, é um pejorativo que conspira contra a própria dignidade da instituição por ele liderada. Nada, absolutamente nada, se pode extrair da Constituição que possa, minimamente, justificar a sua permanência no exercício dessas elevadas funções públicas”, diz a decisão.

Muito bom. Mas por que quatro meses para chegar a esta conclusão? Isso já não estava claro quando da comprovação das contas na Suíça, das manobras no Conselho de Ética ou da chantagem que resultou na abertura do processo de impeachment?

Neste meio tempo, Cunha conduziu o processo que está prestes a derrubar uma Presidente eleita, sem a comprovação de qualquer crime de responsabilidade. Usou de sua posição como presidente da Câmara para comandar um golpe institucional descarado, que poderá ter seu desfecho na próxima semana. Alguém que “conspira contra a dignidade da instituição” definiu os destinos da República.

Não há como fugir da suposição de que Eduardo Cunha foi útil para os que queriam derrubar Dilma e que, uma vez feito seu papel na Câmara, agora pode ser descartado, até mesmo para dar um ar mais “higiênico” para um eventual governo de Michel Temer. Independente das intenções do Ministro Teori, sua omissão nesses quatro meses produziu este resultado.

Mas a higienização do processo golpista só se sustenta a custa de muito desinfetante. A decisão de hoje deixa ainda mais evidente o caráter espúrio da tramitação do impeachment de Dilma na Câmara dos Deputados: aberto e conduzido por um ex-deputado, “delinquente”, que se manteve na condução do processo por um inexplicável silêncio de quatro meses do Supremo Tribunal Federal.

O afastamento de Cunha é um avanço e deve ser comemorado. A omissão anterior de Teori é uma incógnita, que o próprio Ministro tem o dever de esclarecer à sociedade. Dizem que a Justiça tarda, mas não falha. O fato é que desta vez seu atraso poderá fazer o Brasil pagar um preço elevado.

Fonte: Coluna do Guilherme na Folha de São Paulo (05 de maio de 2016)