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Governo dá poder à Samarco, Vale e BHP sobre atingidos

Um acordo extrajudicial vergonhoso deve ser assinado  na segunda-feira, dia 29 de fevereiro, em Brasília. Os governos federal e estaduais (MG e ES) se revelam subservientes e controlados pelos interesses do capital minerário. Após quase um mês de discussão, as bases do acordo da Samarco e suas controladoras – Vale e BHP Billiton – com a Advocacia-geral da União (AGU) e os estados de Minas Gerais e Espírito Santo exigirá homologação da Justiça. A população e as comunidades indígenas atingidas não foram consultadas.

Tudo será supervisionado por um Comitê Interfederativo, que reunirá representantes dos governos federal, estadual e municipal, mas sem nenhum integrante de movimentos sociais, que defendem as vítimas do rompimento da barragens de Mariana, o maior desastre ambiental da história do país.

A minuta do acordo foi obtida pela Agência de Reportagem e Jornalismo Investigativo (Agência Pública).  Trata-se da criação de uma Fundação de direito privado, gerida pelas empresas (Vale, BHP Billinton, Samarco) com poder de decisão sobre os atingidos. Esse acordo extingue a ação civil pública movida contra as mineradoras, e permite que elas negociem no varejo as diversas violações de

Submeter a reparação de um crime à vontade  daqueles que o cometeram é imoral e ao mesmo tempo se trata de perpetrar um outro crime.  O acordo dá poderes de decisão à Vale e BHP Billinton sobre as vítimas. O governo deveria enfatizar um regime que coloca ênfase na responsabilidade legal das empresas, em relação às violações de direitos por elas cometidas. Deveria, sim, criar instrumentos que dão poder e permitam às vítimas exigirem uma reparação, incluindo compensação, restituição e reabilitação dos danos sofridos. A reparação não pode depender dos negócios e oportunidades das empresas em causa. O acordo permite a negociação no varejo das diversas violações de direitos humanos, sociais, econômicos e ambientais, fragmentando as comunidades atingidas e enfraquecendo a força coletiva.

O governo de Minas, uma das partes do acordo, não possui credibilidade para realiza-lo. Não só porque não consultou os atingidos e os movimentos sociais que os representam, mas porque é corresponsável, ao menos subsidiariamente,  no que tange à sua omissão em relação à fiscalização e negligência nos processos de licenciamentos que foram concedidos à Samarco (Vale e BHP Billinton). Por sua vez, a conduta do executivo mineiro desde os primeiros momentos do rompimento da barragem é questionável: deixou o controle da cena do crime nas mãos da Samarco; o governador concedeu sua primeira coletiva de imprensa sobre o desastre dentro das dependências da empresa; e o secretário de Desenvolvimento Econômico do Estado classificou a Samarco como vítima do rompimento de sua barragem. Além disso em meio aos impactos do desastre o governador aprova lei que flexibiliza o licenciamento ambiental, no Estado de Minas Gerais.

Os que defendem o acordo usam o argumento de que se trata de conciliação, uma forma de solução mais breve do que a lentidão dos tribunais. No entanto, a eficácia da lei não se baseia somente nos processos judiciais, mas também no poder de incentivar uma cultura de cumprimento.

É importante ressaltar ainda a denuncia do Comitê em Defesa dos Territórios Frente à Mineração: “A Vale, uma das maiores financiadoras de campanhas eleitorais no país, teve grandes benefícios na construção desse acordo. O Financiamento privado de campanhas eleitorais é a raiz de toda a corrupção. A Vale, empresa que controla a Samarco doou um total de R$ 88 milhões  na campanha de 2014. Desses,  R$ 48,85 milhões a comitês financeiros e diretórios na campanha de 2014. E doou também para candidaturas específicas, do Congresso à Presidência. Isso soma mais R$ 39,32 milhões de reais drenados da Vale para políticos do governo e da oposição  Essas cifras se referem às doações eleitorais de seis empresas ligadas à Vale: Vale Energia, Vale Manganês, Vale Mina do Azul, Minerações Brasileiras Reunidas, Mineração Corumbaense Reunida e Salobo Metais (segundo TSE).”

Esse acordo é um claro exemplo de captura corporativa, em sua forma mais forte. Níveis diferentes de governo à serviço dos interesses corporativos. A Vale e a BHP Billinton minam as políticas e práticas que se destinam a garantir os direitos humanos e o meio ambiente. Governos federal e estaduais atentam contra o interesse público e o direito.

Frei Rodrigo Péret, ofm