Base de Temer se mobiliza para “enterrar” denúncia de corrupção
Fonte: CartaCapital
Aliados trabalham para votar denúncias em bloco e querem emplacar como relator deputado que recebeu doação de Temer em 2014
A Câmara dos Deputados deu celeridade nesta quinta-feira 29 aos procedimentos preliminares da análise da denúncia por corrupção passiva contra o presidente Michel Temer, apresentada pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. A rapidez indica a disposição da base aliada ao governo para manter o peemedebista no cargo apesar das denúncias.
A Câmara recebeu a denúncia na manhã desta quinta e, em uma sessão esvaziada, a deputada Mariana Carvalho (PSDB-RO) leu a petição de Rodrigo Janot. No documento, Janot busca conectar dois conjuntos de fatos para provar a culpa do presidente. O primeiro envolve a negociação da propina semanal feita entre representantes do grupo J&F, de Joesley Batista, e Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), assessor de Temer. O segundo conjunto compõe o estreito relacionamento entre Loures e Temer. Para Janot, há evidências de que, ao pedir e receber propina, Loures estava atuando em nome de Temer.
Na sequência, a denúncia seguiu para a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e Temer foi notificado.
Ao dar encaminhamento à denúncia, a Câmara se prepara para receber outras duas que devem ser apresentadas por Janot até a metade da próxima semana, uma por formação de quadrilha e outra por obstrução de justiça. A ideia dos governistas é analisar as três denúncias em uma única votação. Isso facilitaria as negociações entre o Planalto e o Congresso (que como de costume envolverão a distribuição de cargos e verbas públicas) e reduziria o desgaste de Temer.
“Quem precisa colocar votos é a oposição, que é do quanto pior, melhor. Se a PGR continuar neste objetivo antipatriótico, para atrapalhar o Brasil, ela teria que mandar as próximas [denúncias] em cinco dias, e se mandar o governo pode esperar para enterrar essas denúncias vazias contra os brasileiros em apenas uma votação”, afirmou Darcísio Perondi (PMDB-RS), vice-líder do governo, que recebeu doação de 100 mil reais de Temer nas eleições de 2014.
Segundo Perondi, o governo tem votos suficientes para barrar a denúncia contra Temer tanto na CCJ, que apenas instrui o processo, quanto no plenário da Câmara, que autoriza ou não que Temer seja julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Para que o STF decida se Temer deve virar réu, a corte precisa da autorização da Câmara. Isso se dará apenas se dois terços da Casa (ou 342 deputados) votarem pelo sinal verde ao Supremo.
Ao contrário do que ocorreu na votação do impeachment de Dilma Rousseff, quando Temer era o substituto pronto para ela e se articulou para removê-la do poder, desta vez não há articulação contra o presidente. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que seria o substituto de Temer caso o STF o transformasse em réu, é um firme aliado do peemedebista e não parece ter aspirações presidenciais.
Nesta quinta-feira 29, Maia disse que a decisão sobre a unificação ou não das ações será tomada na hora certa. “Tendo outros argumentos, primeiro caberia ao ministro Facchin determinar o apensamento ou não, mas poderia haver essa discussão na Câmara. Se as denúncias fossem as mesmas, acho muito difícil que não viesse tudo nesta primeira peça”, disse Maia.
Diante da falta de força política, a oposição aposta no desgaste de Temer. “Cada processo é um, corrupção passiva é um, formação de quadrilha é outro e obstrução da justiça é outra”, afirmou o deputado Ivan Valente (PSOL-SP) ao defender a análise separada das denúncias.
Outra estratégia da oposição é lembrar da impopularidade de Temer e atrelar a repercussão negativa do “enterro” da denúncia nas eleições de 2018. “A história reservará a cada um de nós o papel que desempenhar neste caso”, afirmou Júlio Delgado (PSB-MG).
Pressão sobre a CCJ
Apesar de tentar transmitir a imagem de confiança para a votação, o governo vem tomando cuidados para não ser surpreendido. Especial atenção é dedicada a uma posição sensível, a de relator da denúncia na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).
A intenção dos governistas é emplacar na posição um deputado que tenha recebido dinheiro de Temer nas eleições de 2014. Os dois candidatos são Alceu Moreira (PMDB-RS) e Jones Martins (PMDB-RS). Como Perondi, cada um recebeu 100 mil reais em 2014.
Para garantir a nomeação, a base governista começou a pressionar o responsável pela escolha, o presidente da CCJ, Rodrigo Pacheco (MG), que é do PMDB, mas tem atuação crítica ao Planalto. Pacheco virou alvo após dizer que o relator das denúncias de Temer deve “ter relativa independência em relação aos interesses em jogo” e que cada denúncia tenha “trâmite próprio, na Câmara, e um juízo de admissibilidade específico”.
Diante dessas declarações, Pacheco passou a ser ameaçado pela base. Conforme reportagem da agência Reuters, a ideia dos governistas é impedir o funcionamento da CCJ, barrando os trabalhos de Pacheco, até que ele indique um relator dócil ao governo.
A ideia do governo é ter um relatório contrário à aceitação da denúncia e aprová-lo por maioria, para mandar um “recado” sobre a força política de Temer. Independentemente do conteúdo do relatório e da votação na CCJ, quem decidirá o caso, no entanto, é o plenário da Câmara.