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O MTST e a luta por teto, trabalho e pão nas cidades brasileiras

Por Rud Rafael, militante do MTST, da Frente Povo Sem Medo e da TELAR – Territorios Latinoamericanos en Resistencia

 

 

O Brasil inicia 2024 com um cenário desafiador para a luta pelo direito à cidade. A vida segue sendo dura nas periferias do país. Para o jovem da quebrada, para a mulher trabalhadora, para quem ralou a vida toda e pra quem não se aposentou ainda, levantar e seguir a rotina ganhou um pouco mais de esperança de que vai melhorar, com a sensação que o pesadelo passou, mas que ainda tem muito “B.O.” para resolver. O desafio de botar comida na mesa, pagar o aluguel antes de vencer e fazer o bico render o suficiente para pagar os boletos ainda tira o sono.

É, camaradas, vocês não estão sós nessa batalha. Não, vocês também não fracassaram. O que se esgotou foi esse modelo de cidade que produz pessoas sem-teto, sem-solidariedade, sem-direitos. Um modelo que exclui as maiorias dessa cidade, que é construída com o suor do trabalho das periferias.

Porque casa tem. O Brasil bateu 11,4 milhões de domicílios vagos, minhas irmãs e meus irmãos. Casa que não serve para morar, mas para lucrar e especular. Já pensaram? Do outro lado da balança da injustiça, são 5,8 milhões de famílias sem-teto no corre, para garantir um direito que está lá na Constituição Federal. 

Alimento? Também tem! Somos o terceiro maior produtor de alimentos do mundo e é inconcebível que tenhamos atingido 33 milhões de pessoas passando fome e mais de metade da população com algum nível de insegurança alimentar. Isso mostra que o que mostra que o agro não é Pop, não é Tech e que é fundamental neste momento avançar na retomada das políticas de fortalecimento da agricultura familiar e expandir a agroecologia urbana como promotor de soberania nas periferias.

E a economia, como vai? A economia brasileira se recupera, salta para nona economia do mundo, controla a inflação, há uma reativação da política de aumento real do salário mínimo e geração de empregos. Riqueza vem sendo socialmente produzida, mas acumulada de forma, cada vez mais, privada. Cresce o número de bilionários no país em que se amplia a precarização do trabalho, com formas desprotegidas e superexploradas.

 

Qual a resposta possível nesse cenário?

A aposta do MTST, que em 2024 completa 27 anos de surgimento, é na definição de uma estratégia política que recupere a capacidade de um movimento que pense a realidade como um sistema, e não com pautas isoladas. Um sistema que se reconstrói a partir da solidariedade que pulsa na periferia e que o fiel da balança da sobrevivência numa sociedade de múltiplas violências (racista, capitalista, patriarcal). Neste sentido, a síntese desta luta pelo direito à cidade que acreditamos se dá na bandeira de defesa de: teto, trabalho e pão!

Fazemos isso pela trajetória de organização a partir das ocupações, mas de quem também já atestou a qualidade de produção habitacional de milhares de moradias, tirando famílias do sufoco do aluguel, das áreas de risco e da insalubridade da coabitação.

Uma defesa que também se construiu na linha de frente das múltiplas crises humanitárias vivenciadas na pandemia e na experiência genocida do governo Bolsonaro, que gerou a nacionalização da experiência das Cozinhas Solidárias, que, para além de alimentar o povo, constrói novos horizontes com a oferta de outras atividades e articulação com outros direitos e serviços nos territórios. 

Com a chegada do Governo Lula, as Cozinhas viraram política pública, graças à organização do movimento, da articulação com outras organizações do campo da soberania alimentar, mas também da incidência do mandato de Guilherme Boulos, relator do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA).

É nessa articulação entre frente de atuação de massas e incidência institucional que, não só retomamos políticas importantes, como o PAA e o Minha Casa, Minha Vida Entidades, mas criamos espaços para produção de inovações políticas e atuação sobre temas estratégicos, como tem mostrado a Secretaria Nacional de Periferias, e o secretário Guilherme Simões, militante histórico do MTST e cria do Grajaú, em São Paulo. 

Assim, como a Secretaria tem capitaneado experiências importantes em relação à prevenção de riscos nas periferias, cresce também a importância, para o MTST, de colocar a questão ambiental no centro do debate urbano, dado o impacto da crise climática no avanço do racismo ambiental e na geração, em escalas sem precedentes, de sem-tetos.

A luta por trabalho decente vem sendo encampada em iniciativas importantes como o Contrate Quem Luta, que oferta os mais diversos serviços da companheirada sem-teto, mas também na criação com o Movimento de Trabalhadoras(es) Sem Direitos, que tem articulados múltiplos setores dos mais de 40 milhões de informais no país, seja entregadoras(es) de aplicativos à ambulantes.

Outras frentes importantes para pensar a luta pelo direito à cidade vem sendo construídas, como a luta contra as privatizações, feita a partir também da Frente Povo Sem Medo, a disputa em torno dos conflitos fundiários a partir da Campanha Despejo Zero e o que se construiu de debate em torno de uma agenda urbana em espaços como a Conferência Popular pelo Direito à Cidade (2022), que resultou na construção da Plataforma de Lutas pelo Direito à Cidade e o seminário de 60 anos da reforma urbana, realizado no ano passado. 

Todas essas referências serão fundamentais, inclusive, para a trincheira de debate institucional, seja no ciclo de Conferências das Cidades, seja nas eleições municipais, ambas ocorrerão este ano. É preciso uma grande frente em defesa de cidades anticapitalistas, antirracistas, antipatriarcais e que estejam ancoradas nas ideias de democratização do espaço urbano, da função social da cidade e da propriedade e da justiça ambiental. O MTST fará incansáveis lutas nessa direção e esperamos contar com geral no desafio de conquistar teto, trabalho e pão e ir pavimentando caminhos para a revolução.